sábado, 30 de julho de 2011

Sentado no Divã: minhas eternas noites de insônia.

    Antes de qualquer coisa, não me venha com reclamações, Clóvis. Eu sei que eu sumi. Não se acostumou ainda pelo jeito. Eu e a minha linda mania de fazer tudo cronometrado meticulosamente em minha rotina, dando espaço a prioridades, e às vezes, esquecendo daquilo que realmente me faz bem. O importante, é que a insônia e a lua cheia fazem-me lembrar de você. Seja paciente comigo. 

   Ah, se eu estou diferente? É o que as pessoas dizem. Desde que entrei para academia deixei uns quilos para trás e ganhei uma breve mudança em meu corpo. Não digo definições, nem muito menos músculos, digo que parece que mudei tanto, que à uns dias atrás eu nem me reconhecia nas fotos e nem no espelho. Não tenho mais aquela cara de criança fotogênica e o meu corpo está naquele processo de pertencer a um futuro rato de academia. Antes as pessoas me davam 22 anos, hoje, estou escutando que tenho 25 anos, no mínimo. Como as mudanças interiores podem nos transformar tanto? Se mudamos, tudo muda. Hoje eu sei o real significado disso. Deve ser o mesmo que dizem quando pensamos coisas boas, atraímos coisas boas, porém não é muito isso que acontece nessa vida severina que muitos levam. 
   
   Se me considero parte daquele Arthur que começou a escrever em novembro do ano passado e hoje está totalmente diferente? Creio que aquele Arthur se modificou. Nunca mudei minha personalidade, apenas a aprimorei. E com certeza carrego bagagens daquela vida antes dos textos. Estou começando a sentir que estou percorrendo o atalho da felicidade certos dias, ou apenas em certas horas de minha vida. Passei em segundo lugar na faculdade de Direito. Eu sei que foram usados apenas como métodos de avaliação o meu histórico escolar e uma redação. Mas convenhamos? Com o tempo, mesmo eu ainda sendo um iniciante nas palavras, eu fui aprendendo a como manuseá-las. O tema ajudou. Felicidade e remédio. Poderia escrever um livro sobre isso. Botar uma pessoa que já sofreu tanto na infância, que nunca teve aquela casa com janelas douradas e cafés da manhã na mesa com seus pais, que sempre teve que se virar ao máximo para conseguir aquilo que quer, uma pessoa que conseguiu superar uma depressão sem ajuda de remédios ou analistas, realmente tem muito para falar sobre felicidade. Não fui para uma federal, Clóvis, mas só de sentir o prazer que é, você passar nessa colocação e poder escolher, se quiser, entre as faculdades particulares de sua cidade qual você quer cursar, já me tira um peso e tanto das minhas costas.  Minha vida de “vagabundo” vai acabar segunda-feira. Foi um ano parado, um ano podendo fazer o que eu bem entender, um ano acordando a hora que mais me convém, três meses tendo apenas como compromisso a academia, o melhor e mais melancólico tempo da minha vida. Espero que os pais compreendam, um dia, esse tempo que o filho precisa para formular sua vida. Afinal, é uma transição de adolescência para adulto. Exige grande garra, compreensão e apoio nas dúvidas e desejos. Hoje eu sei o que eu quero, sei como a vida pode ser conduzida. As dúvidas sempre vão existir, mas a maturidade adquirida irá fazer o seu papel de confortar pelos "ups and downs" da vida. 

   Para comemorar ao meu estilo, resolvi encontrar uma pessoa. Não nos víamos há quase um ano, não foi muito boa a última vez. Dessa vez foi maravilhoso! Fomos até o King’s. Nunca tinha ido até lá, sempre o achei caro. Mas dinheiro realmente tem importância quando você já passou no vestibular? Para mim não tem, eu ganhei de presente isso tudo. Foram 3 horas contadas no relógio de um vermelho intenso e um quarto que lembrava muito a imagem da iluminada Paris. Ao final, entrei na ducha quente e não quis sair de lá. Era o meu momento e não queria compartilhar com mais ninguém. Deixei tudo que eu queria pensar viesse à cabeça para ir embora junto com a água pelo ralo. O banheiro era pura fumaça, diferente da fumaça que brotou na cama horas passadas. No espelho deixei um “Buona Sera” a quem iria limpar o quarto mais tarde. Queria compartilhar a minha felicidade com o mundo naquele dia, Clóvis. E quer saber? Problemas todos nós temos e sempre teremos como pedras em nossas carteiras que nos fazem caminhar mais devagar. Dias tristes virão como a certeza do Sol em um dia nublado. Lágrimas irão cair ao assistir um filme de romance assim como a chuva de verão vem para nos confortar do calor. É nessas horas de felicidade que vemos como a vida pode ser bela ao ser vivida ao máximo. "Eu me vivo", ao máximo. Foi assim e espero ser para sempre dessa maneira. Afinal, "I was born this way".  Até algum outro dia, meu grande amigo. Fui ser feliz!    

 

domingo, 10 de julho de 2011

A vida de um Augusto (2)

Capítulo II

   O que você mais se lembra de sua infância? 
   Um parque divertido? Manhãs acordando tarde e chegando atrasado para brincar na rua simplesmente porque ficou em casa assistindo Três Espiãs Demais ou Bob Esponja? Ou da escola que tinha como quintal o mar de uma cidade litorânea? 
   Eu vivi os meus primeiros cinco anos sabendo que eu não tinha uma família como às outras. Comecei morando com os meus avôs paternos e de repente me vi na casa de minha bisavó. Quando se é pequeno você se agarra em alguma esperança, eu sempre imaginava que aquilo que estava faltando iria ser completado um dia. 
   A única lembrança que tenho de meu pai foi quando demos comida aos nossos canários azuis que ficavam no quintal da antiga casa. Depois eu só conseguia me enxergar sozinho, naquele mesmo quintal, comendo a parte recheada do biscoito e tacando a metade ausente de chocolate no lixo. 
   Não se tinha muito que fazer quando eu ainda morava naquela antiga casa. Parecia que a minha única obrigação era lembrar-se de colocar a canequinha colorida dentro da mochila para hora do recreio na escolinha do dia seguinte. Não sabia o que era ausência e muito menos o significado de saudade. Não via minha mãe durante o dia e a noite, quando não estava trabalhando, estava se divertindo em algum lugar da cidade. Minha bisavó que hoje está ausente de mim era a minha maior devoção. 
   Como ela pôde agüentar todas as minhas perguntas? Como ela conseguia tirar tempo para brincarmos toda noite de jogo da memória ou ler alguma história para mim? Como ela conseguia suportar ficar acordada mesmo sabendo que teria que madrugar no outro dia apenas para ficar assistindo escolinha do professor Raimundo comigo ao seu colo? 
   Bons tempos. Lembro até hoje que ao deitarmos eu não gostava da cama de casal, eu preferia uma bicama: eu dormindo em cima e ela embaixo. A mão de minha bisa tinha que ficar segurando a minha até eu pegar em sono profundo, senão eu despertava, chorando como qualquer criança que ainda tinha o seu direito de chorar. 
   Há amores que não conseguimos explicar. O amor de minha bisa por mim fazia parte de algum tipo de amor que além de gostar de cuidar, tinha toda a paciência do mundo mesmo quando eu estava errado e merecia um castigo. Eu nunca a vi chorar. Mulher de ferro era essa minha heroína. 
   Quando completei cinco anos, minha mãe conheceu a pessoa que dizia ela ser o amor de sua vida. Ainda não entendo como uma jovem que dizia já ter sofrido tanto achar o maior dos vilões de um filme de terror. Pelo menos para mim, ele se tornaria o meu vilão nos próximos sete anos de minha vida e eu nem sabia disso. 
   Sendo criança eu sentia medo. Chorei para não largar a minha bisa e meus avós paternos. Senti mais medo quando soube que não haveria lei que me protegesse daquilo e quando vi, estava chorando ainda mais indo embora da minha cidade natal e deixando todos que eu amava e que me amavam com lágrimas nos olhos pela minha partida.

sábado, 2 de julho de 2011

A vida de um Augusto (1)

Prólogo

  Bem, uma história existe começo, meio e fim. Eu sempre fui muito rotineiro e extremamente exigente com a ordem, portanto irei começar pela parte que eu ,se quer, lembro-me de minha própria existência. Eu nasci em uma época de revolução. Não no começo dela, porém em suas conseqüências. Já tinham ocorrido aquelas matérias de história do Brasil que vemos quando estamos nos formando no final do ano letivo do último ano do ensino médio. Era em um verão quando mais um Augusto nasceu, o que não se explicava o frio que pairava no ar devido a expectativa de minha chegada, se é que occorreu isso mesmo. Não se sabe se foi por um simples gozo ou por uma bela gozação da vida. E desde então, devo alertá-lo, essa não é uma nova história e muito menos uma história de amor. Você poderá rir ou simplesmente chorar seja por alegria ou de tristeza, seja por reconhecer fatos que também ocorreram com você seja porque você tirou um simples aprendizado e o carregou em sua vida.
   A mãe dele tinha 15 anos e seu pai 17 anos. Ambos muitos novos. Hoje quase um fato corriqueiro que vemos nos noticiários. Quando o médico terminou a cirurgia houve uma engraçada brincadeira sendo contada para os pais paternos: “Os senhores já podem sair daqui e comprar uma bola, um carrinho e uma boneca, pois três crianças sairão daqui a instantes, o seu filho, a sua nora e o seu neto”. Era de se estranhar naquela época, os valores eram outros. Ou talvez não, apenas adaptamos os valores aos nossos próprios gostos e vontades, a vida egoísta e mutável que às vezes levamos nos obriga a mudar o que somos e no que acreditamos. Augusto nasceu em verão não muito longo, mas o suficiente para ser um jovem hoje. Uma criança que iria viver tudo o que queria viver, ter um coração viajante e uma mente que seria os seus pés fora do chão.
   Seu nome traduzido para o latim o tornaria um homem apto e capaz de ultrapassar todas as barreiras. Ele só não sabia que seriam inúmeras e que o tempo não iria parar para ele se refazer a cada queda. Traduzido para o grego, porém, ele se tornaria aquele que é incapaz de vingança. Augusto seria a pessoa que poderia ser o maior dos vilãos, o mais triste do bairro, o mais carente dos dependentes. Nasceu com o coração iluminado. Aprendeu que o rancor só derruba uma pessoa: aquela que o sente. Hoje ele enxerga assim, entretanto não foi bem assim que ele viveu pelos anos decorrentes.
   Até onde começa e termina a infância? Para a medicina e pedagogia há um tempo específico. Augusto sempre a considerou parte dele. Hoje ele não a apaga, pois sabe que cada acontecimento deixado de lado, junto com as suas feridas, seria um aprendizado sendo esquecido. Ele parece maduro. Só parece. Ele aprendeu com as experiências, nunca precisou de livros ou relatos de quem já viveu. Ele teve uma infância. Com certeza, não são aquelas contadas em filmes de finais felizes e nem muito menos com famílias perfeitas...